A importância do Comunicado de Venda (artigo 134 do CTB).
A prática comercial na compra e venda de veículos envolve certa burocracia que muitas vezes, passa desatenta ao negócio que está sendo realizado. Com o aumento do poder aquisitivo, o sonho do veículo próprio passa a ser uma realidade tangível para muitos brasileiros, e, até mesmo a atualização para um veículo novo e com mais conforto, acontece com maior frequência.
Juntamente com as oportunidades, surgem as normas que regulam as transações comerciais. Por desconhecerem a regra entabulada pelo Código de Trânsito Brasileiro (CTB), os proprietários acabam por não comunicar a venda de seus veículos ao Órgão de Trânsito, só recordando da obrigação quando vira um grande pesadelo.
O CTB impõe ao anterior proprietário o mandamento de comunicar a venda do veículo ao Órgão de Trânsito, sob pena de responsabilidade solidária das infrações de trânsito, vejamos:
Art. 134. No caso de transferência de propriedade, o proprietário antigo deverá encaminhar ao órgão executivo de trânsito do Estado dentro de um prazo de trinta dias, cópia autenticada do comprovante de transferência de propriedade, devidamente assinado e datado, sob pena de ter que se responsabilizar solidariamente pelas penalidades impostas e suas reincidências até a data da comunicação.
Parágrafo único. O comprovante de transferência de propriedade de que trata o caput poderá ser substituído por documento eletrônico, na forma regulamentada pelo Contran.
Por outro lado, aquele que adquire o veículo também tem a obrigação de transferi-lo para seu nome, segundo versa o artigo 123 do CTB:
Art. 123. Será obrigatória a expedição de novo Certificado de Registro de Veículo quando:
I - for transferida a propriedade;
[...]
§ 1º No caso de transferência de propriedade, o prazo para o proprietário adotar as providências necessárias à efetivação da expedição do novo Certificado de Registro de Veículo é de trinta dias, sendo que nos demais casos as providências deverão ser imediatas.
A desatenção às normas O artigo 257, § 3º do CTB imputa ao condutor a responsabilidade pelas infrações decorrentes de atos praticados na direção ao veículo.
As consequências da sua não realização importa em responsabilidade solidária por parte do vendedor, principalmente no que tange à pontuação das multas, decorrente de eventuais infrações cometidas, podendo levar até mesmo a suspensão do direito de dirigir.
Mesmo com a presença das normas e penalidades, ainda é comum a falta de transferência:
Sabendo que o comunicado de venda do veículo é a regra, o que fazer nos casos em que não foi realizado o procedimento?
O melhor caminho a percorrer será realizar, ainda que tardia, o comunicado de venda. Para tanto, basta apresentar cópia autenticada do Documento Único de Transferência no Órgão de Trânsito mais próximo de seu domicílio. E em relação às eventuais multas, interpor recurso. Não esqueça de juntar cópia do protocolo do comunicado da venda.
Mas, se você chegou até aqui, posso presumir que não tenha a cópia do Documento Único de Transferência. Nestes casos, poderá ser proposta ação judicial.
Está previsto no Código Civil, artigo 1.226, que “os direitos reais (nele se inclui a propriedade) sobre coisas móveis, quando constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com a tradição”.
Adiante, no mesmo diploma legal, mais precisamente no artigo 1.275, verifica-se que além das causas consideradas, perde-se a propriedade, dentre elas, pela renúncia.
Além das causas consideradas neste Código, perde-se a propriedade:
[...]
Nesta toada, conclui-se que a compra e venda de veículo é negócio jurídico que se completa com a tradição do bem, que por sua vez, consiste na entrega do veículo mediante pagamento.
Portanto, a alegação de a responsabilidade ser solidária entre vendedor e adquirente, em relação às multas de trânsito, até a data de comunicação da venda, por força do disposto no artigo 134 do CTB resta severamente mitigada e prejudicada.
São muitas as decisões[1] do Superior Tribunal de Justiça que abranda a norma imposta pelo artigo 134, entendendo que, ainda que inexistente a comunicação de venda, e, em sendo incontestável a tradição do bem, não responde pelas infrações o antigo proprietário.
O Ministro Humberto Martins, em julgado[2] recente sobre o tema, asseverou que a regra prevista no artigo 134 do CTB “sofre mitigação quando ficar comprovado nos autos que as infrações foram cometidas após aquisição do veículo por terceiro, mesmo que não ocorra a transferência, afastando a responsabilidade do antigo proprietário”.
É preciso advertir que cabe ao antigo proprietário constituir forte lastro probatório da tradição do veículo, sob pena de não ter o pedido julgado totalmente procedente.
Consulte um advogado de sua confiança e especialista em Direito de Trânsito que, certamente, poderá lhe auxiliar a resolver esse imbróglio.
[1] 0008975-07.2014.8.19.0037. Apelação. Des (a). Mario Guimarães Neto. Julgamento: 03/04/2018. Décima Segunda Câmara Cível; 0005628-29.2015.8.19.0037. Apelação. Des (a). Wagner Cinelli de Paula Freitas. Julgamento: 04/10/2017. Décima Sétima Câmara Cível; AGRG no Aresp 452.332/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, Julgado Em 18/03/2014, Dje 21/03/2014; AGRG no Aresp 369.593/RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, Julgado Em 03/12/2013, Dje 31/03/2014.
[2] AgRg nos EDcl no AREsp 299.103/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe 30/8/2013.
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